Finalmente criei um blog, mas infelizmente os textos que coloco não são da minha autoria, um dia, quem sabe, me atrevo a escrever alguma coisa.
Estou tentando, ao máximo, ser fiel aos escritores, mas nem sempre consigo, então na incerteza da autoria, estou colocando AD (Autor Desconhecido). Com relação às fotos, estou buscando no Google e não cito as fontes por não saber a quem pertence.
Caso você encontre aqui algum erro de autoria, alguma foto que não posso usar sem citar a fonte, favor comunicar.

Meus beijos e sejam bem vindos!
Virgínia Costa

sábado, 30 de abril de 2011

Veteranos de guerra


Depois de uma certa idade, somos todos veteranos de alguma relação amorosa que deixou cicatrizes

Outro dia li o comentário de alguém que dizia que o casamento é uma armadilha: fácil de entrar e difícil de sair. Como na guerra.

Aí fiquei lembrando dos desfiles de veteranos de guerra que a gente vê em filmes americanos, homens uniformizados em suas cadeiras-de-roda apresentando suas medalhas e também suas amputações. Se o amor e a guerra se assemelham, poderíamos imaginar também um desfile de mulheres sobreviventes desse embate no qual todo mundo quer entrar e poucos conseguem sair – ilesos. Não se perde uma perna ou braço, mas muitos perdem o juízo e alguns até a fé.

Depois de uma certa idade, somos todos veteranos de alguma relação amorosa que deixou cicatrizes. Todos. Há inclusive os que trazem marcas imperceptíveis a olho nu, pois não são sobreviventes do que lhes aconteceu, e sim do que não lhes aconteceu: sobreviveram à irrealização de seus sonhos, que é algo que machuca muito mais. São os veteranos da solidão.

Há aqueles que viveram um amor de juventude que terminou cedo demais, seja por pressa, inexperiência ou imaturidade. Casam-se, depois, com outra pessoa, constituem família e são felizes, mas dói uma ausência do passado, aquela pequena batalha perdida.

Há os que amaram uma vez em silêncio, sem se declararem, e trazem dentro do peito essa granada que não foi detonada. Há os que se declararam e foram rejeitados, e a granada estraçalhou tudo por dentro, mesmo que ninguém tenha notado. E há os que viveram amores ardentes, explosivos, computando vitórias e derrotas diárias: saem com talhos na alma, porém mais fortes do que antes.

Há os que preferem não se arriscar: mantêm-se na mesma trincheira sem se mover, escondidos da guerra, mas ela os alcança, sorrateira, e lhes apresenta um espelho para que vejam suas rugas e seu olhar opaco, as marcas precoces que surgem nos que, por medo de se ferir, optaram por não viver.

Há os que têm a sorte de um amor tranquilo: foram convocados para serem os enfermeiros do acampamento, os motoristas da tropa, estão ali para servir e não para brigar na linha de frente, e sobrevivem sem nem uma unha quebrada, mas desfilam mesmo assim, vitoriosos, porque foram imprescindíveis ao limpar o sangue dos outros.

Há os que sofrem quando a guerra acaba, pois ao menos tinham um ideal, e agora não sabem o que fazer com um futuro de paz.

Há os que se apaixonam por seus inimigos. A esses, o céu e o inferno estão prometidos.

E há os que não resistem até o final da história: morrem durante a luta e viram memória.

Todos são convocados quando jovens. Mas é no desfile final que se saberá quem conquistou medalhas por bravura e conseguiu, em meio ao caos, às neuras e às mutilações, manter o coração ainda batendo.


(Martha Medeiros)
Jornal Zero Hora - 02 abril 2011

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