Finalmente criei um blog, mas infelizmente os textos que coloco não são da minha autoria, um dia, quem sabe, me atrevo a escrever alguma coisa.
Estou tentando, ao máximo, ser fiel aos escritores, mas nem sempre consigo, então na incerteza da autoria, estou colocando AD (Autor Desconhecido). Com relação às fotos, estou buscando no Google e não cito as fontes por não saber a quem pertence.
Caso você encontre aqui algum erro de autoria, alguma foto que não posso usar sem citar a fonte, favor comunicar.

Meus beijos e sejam bem vindos!
Virgínia Costa

quarta-feira, 29 de maio de 2013

As primeiras sensações


Faça o teste: as coisas que você se lembra de uma paixão antiga são aquelas que aconteceram no começo. Primeiras conversas, primeiro sexo, primeira viagem, primeira vez na casa da família. Se você for mulher, talvez se lembre de sensações, mais que de eventos: a expectativa, as surpresas, o prazer de conquistar e ser conquistada. Por alguma razão, esses momentos inaugurais ficam gravados na memória como uma espécie de trauma feliz. Eles se tornam a nossa referência, uma régua existencial contra a qual comparamos o que vem depois: maior, igual, melhor, diferente, pelo-amor-de-Deus!
Para o nosso azar, a régua continua medindo depois que nos metemos numa relação estável. Acasalados, nós temos amor, cumplicidade, transamos de forma intensa e regular. Nada, rigorosamente, nos faz falta. Mas a memória, como um farol oceânico quebrado, segue mandando flashes periódicos sobre os velhos tempos – e nós, miseravelmente, somos obrigados a admitir que aquela intensidade nos faz falta.
Gostaríamos, se isso fosse possível, de estar lá e cá ao mesmo tempo. Ter a paz profunda e protetora de agora, com as emoções aceleradas de então. Ter o gozo profundo e a segurança da intimidade conquistada, mantendo a surpresa e o arrebatamento do sexo inicial. No mundo ideal, a mulher amada e familiar, cuja presença faz nosso coração bater tranquilo, nos chamaria, no meio da noite, com uma voz estranha – e se abriria, magicamente, a possibilidade de transar com uma desconhecida. 
Como o mundo ideal e a magia não existem, somos forçados a lidar com a realidade. Nela, temos de escolher, todos os dias, entre aquelas emoções iniciais e as outras, muito mais serenas, que nem sequer parecem emoções. Pense nisso: a gente se acostuma de tal forma ao conforto de uma relação estável que ela parece despida de sentimentos. O carinho e o afeto de tão presentes na rotina se tornam invisíveis. A gente só enxerga brigas, frustrações, irritações comezinhas. Qual o valor daquele abraço no meio da noite, que parece reparar alguma coisa que estivera quebrada ao longo do dia? Qual a importância daquele olhar de despedida matinal, que parece conter, simultaneamente, tantas mensagens de reafirmação? Quando a gente perde essas coisas, quando briga e fica sozinho, a importância da rede invisível se revela de forma instantânea. A alma nos cai aos pés, como dizem os espanhóis. Daí a dor inexplicável de quem achava que nada tinha a perder...
 Não é bom subestimar o poder de sedução das primeiras emoções. Para muitos, - sobretudo aqueles com grande capacidade de seduzir -, as sensações iniciais são uma espécie de vício. Como uma droga, mesmo. A pessoa precisa da trepidação para sentir-se viva. Tem necessidade do estado de exaltação amoroso para estar bem. O resto, o que vem depois, o momento em que o rio se espraia, manso, depois da corredeira – isso não tem graça. Então é preciso estar sempre correndo atrás da novidade, da primeira vez, da empolgação e da descoberta. É um jeito de viver – acreditando que a próxima relação, essa sim, trará a paz que se andou buscando a vida inteira.
No livro Como pensar mais sobre sexo, que eu li outro dia e adorei, o filósofo Alain de Botton diz que a gente rotineiramente deseja coisas demais, contraditórias entre si. Depois de tentar sem muito sucesso sugerir fórmulas para superar a fadiga emocional dos namoros e casamentos prolongados, ele acaba concluindo que, no fundo, todos nós temos de fazer escolhas difíceis. Ou bem se vive como um adolescente cheio de tesão enquanto der, ou bem se abre mão de um punhado de coisas e tenta se construir relações duradouras e família, enquanto der. Sim, porque a vida e a biologia não vão parar, esperando que a gente se decida. O tempo avança e atropela as nossas hesitações.
Da minha parte, eu tento fazer força para não tomar como um fato da vida aquilo que eu tenho todos os dias. Tento lembrar que aquela criatura ali ao lado poderia estar em outro lugar, com outra pessoa, em vez de estar aqui, me mimando com o seu carinho e a sua zelosa atenção. Pensar essas coisas dá alguma insegurança, mas ela é boa. Ela ajuda a lembrar da importância do que a gente tem. Obriga a agir com mais atenção, com mais paciência, com mais delicadeza até no trato com a parceira. Com sorte, esse estado de alerta ajuda a fazer coisas que surpreendam e encantem. Propicia gestos que alimentem a paixão. Não como no começo, não exatamente como no tempo em que o amor era novo, mas o suficiente para lembrar que ele existe. Aqui e agora, não apenas no passado.

(Ivan Martins)



O conforto do outro

Viver sozinho é uma opção moderna. O sujeito não é acordado pelo despertador dos outros, volta para casa na hora que quer e vê o que deseja na televisão. Nunca tem de interromper a leitura para escutar a última história sobre a família, o trabalho ou os amigos de ninguém. Se em algum momento estiver carente, tenta encher o quarto com o corpo e as ideias de uma mulher de quem ele goste. Temporariamente.
Vale o mesmo para as mulheres, claro. Muitas vivem perfeitamente à vontade com o silêncio, o vinho e os cosméticos de quem está sozinha. Cozinham para ela e as amigas, assistem duas temporadas inteiras de uma série no fim de semana e, se der vontade, arrumam companhia com mais facilidade do que os homens. Desde a invenção da internet, até o delivery de sexo por meio dos sites de relacionamento ficou fácil. Nem precisa mais sair de casa.
Ainda assim, as pessoas se juntam, namoram e passam a dormir juntas todos os dias. Diante dos confortos e facilidades da vida urbana, essa atitude às vezes me parece um mistério. Por que abrir mão da enorme e promissora liberdade do século 21 para se confinar ao espaço de um único relacionamento, que tende a ser mais estreito e mais restrito do que qualquer arranjo solitário? Supondo que os envolvidos não queiram ter filhos, claro. Se quiserem, é outra história. Até hoje, ninguém inventou um ambiente melhor para criar filhotes humanos do que uma casa em que haja dois adultos dividindo essa pesada responsabilidade.
Mas pouca gente pensa em filhos quando começa um relacionamento desses em que se dorme junto toda hora. Elas querem outra coisa quando se metem na casa dos outros ou permitem que os outros se metam na casa delas. Se você perguntar, dirão que é algo grandioso como amor ou compromisso. Eu duvido. Essas palavras representam abstrações intangíveis na vida real, enquanto as nossas decisões diárias são baseadas em elementos concretos da existência. Mesmo que isso seja inconsciente. Dou exemplos:
Quando as pessoas dizem amor, elas estão pensando, concretamente, em sexo e companhia constante. É isso que um relacionamento sólido garante. Alguns dias por semana, ou todos os dias, você tem assegurada a presença física de alguém de quem gosta – e pode fazer várias coisas com esse corpo querido.
Pode tomar banho com ele, dormir encostado nele, transar com ele do jeito que gosta ou mesmo amarrar e bater, se você for da turma dos Cinquenta Tons de Cinza. Isso do ponto de vista estritamente físico. Mas um corpo, claro, tem também um cérebro com informações e capacidade analítica. Essa parte neurológica da sua companhia pode ser usada para lembrar o nome de um filme, discutir seus projetos profissionais, refletir sobre os seus sentimentos conturbados ou para esclarecer um detalhe do processo do Mensalão que você não entendeu. Não se pode deixar de lado, evidentemente, a função social do corpo parceiro. Você pode viajar com ele, levá-lo ao cinema ou almoçar com ele na sua mãe, aos domingos. Assim fica mais gostoso fazer coisas que de outro jeito você acharia aborrecidas.
As pessoas precisam de ajuda, aconchego, distração. Tudo isso vem no pacote físico do relacionamento. Se você não tem alguém na sua vida, vai fazer supermercado sozinho toda semana. O que pode ser pior do que isso? Cozinhar pode ser outra tarefa intolerável com apenas duas mãos. Falta quem lave as folhas, pique a cebola e guarde a louça depois do jantar. E não é só isso. Quem ajuda a colocar as malas no carro? Quem vai levar para casa o amigo que bebeu demais? Quem decide a cor da porcaria da parede e o formato da droga da pia do banheiro? Quem faz você rir do seu mau humor matinal? Quem abraça você se chegar em casa chorando depois de um dia de cachorro? Para isso tudo serve o namorado, a mulher, o corpo parceiro.
Acho que essas razões concretas, e não as palavras altissonantes, explicam por que as pessoas abrem mão da liberdade moderna para meter-se em relacionamentos. O conforto do sexo e da companhia constante não se consegue de outra forma. Não está à venda no supermercado e não tem no delivery dos sites de relacionamento. Para ter alguém enchendo a sua vida – e algumas vezes o seu saco – é preciso renunciar a parte da sua independência e do seu sossego, deixar que o outro invada o seu espaço com móveis esquisitos, conversa fiada e despertadores barulhentos. Faz parte. Quem já passou por isso sabe que nem sempre é sensacional, mas ultimamente, agora, esta manhã, tem sido indescritivelmente bom.

(Ivan Martins)